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  • Foto do escritorJoão Múrias

Crítica: Adele voltou melhor do que nunca, na sua versão mais intimista

Atualizado: 19 de jan. de 2022

Após seis longos anos, Adele lançou o seu quarto álbum de carreira, “30”. A cantora britânica serve-nos um cocktail de amor gélido e frustrações penosas. Aqui a receita não tem segredos. Uma pitada de fragilidade e uma dose de superação é a medida certa para um produto final emocionalmente sublime.

Capa do álbum 30. Fonte: adele.com

O álbum, produzido entre 2019 e 2020, revela os sentimentos mais íntimos de Adele durante o “período mais turbulento” da sua vida. A longa-duração, faz jus à durabilidade da relação, centrando-se essencialmente no divórcio da cantora. Adele explica, através da música, a sua face da moeda daquilo que aconteceu, ao filho de 9 anos, Angelo. Para além disso, o álbum aborda outras temáticas, como a maternidade, a solidão, o recomeço e o amor-próprio.


“I'll be taking flowers to the cemetery of my heart”. É este o mote que inicia a profunda dor e o longo processo de luto do mais recente projeto musical da cantora. “Strangers by Nature” é uma canção marcada pela cultura jazz e pelas baladas cinematográficas, não fosse ela co-produzida pelo compositor de bandas-sonoras, vencedor de um Oscar, Ludwig Göransson.


A segunda canção do álbum, “Easy On Me”, é uma aposta segura para primeiro single da cantora em seis anos. A balada reflete o final de um casamento, focando-se nas dificuldades de manter uma família, agora dividida: “You can’t deny how hard I have tried / I changed who I was / To put you both first / But now I give up”.



A forte necessidade de explicar o divórcio ao filho, levou Adele a escrever “My Little Love”. Abalada numa desmedida tristeza e intensa desilusão, a terceira canção do álbum mostra o coração de uma mãe-solteira, sentido de falhas para com o filho: “I know you feel lost, it’s my fault completely”; “So I ain’t surprised you can read through all of my lies / I feel so bad to be here when I’m so guilty”.


O ouvinte imerge no círculo privado da cantora ao ouvir um voicememo de uma conversa intimista entre Adele e o filho, comprovando a cumplicidade de ambos. “My Little Love” é uma canção crua e honesta que ilustra a vulnerabilidade das relações. A canção muda o foco das relações amorosas para a maternidade, a única relação que verdadeiramente é para a vida toda.


A meio do álbum chega “I Drink Wine” com fortes influências gospel. A canção inicia com perguntas que todos nós já fizemos em alguma fase da vida: “How can one become so bounded by choices that somebody else makes? / How come we’ve both become a version of a person we don’t even like?”. A letra canta os sonhos de criança e, uma vez mais, o fim da relação, mas numa perspetiva de superação e positividade. O remate final é dado por um desabafo introspetivo da cantora.


“Hold On” é a música onde Adele conforta os seus sentimentos de vazio e solidão, aprendendo a viver e a superar os momentos mais tristes da sua vida. O refrão traz um sentimento de esperança a uma música que também fala sobre a sensação de sufoco e desespero: “Let pain be gracious / Love will soon come / Just hold on”. A produção da faixa musical transmite a nostalgia de uma música de igreja. Certamente vai se tornar um hino de amor-próprio e de superação pessoal.


A penúltima canção, “To Be Loved”, é a melhor do álbum. Em termos vocais, Adele entrega-se de maneira única, superando-se a si mesma e atingindo notas nunca antes alcançadas. A música traduz a imensa mágoa que todos já sentimos e que nos custa tanto livrar. A melancólica balada de piano agarra o ouvinte desde o primeiro segundo, que não consegue ignorar a dor que sente ao ouvir a voz sofrida de Adele. “Let it be known that I tried” é a frase que resume, na perfeição, esta música. Quem é que nunca quis que uma certa pessoa reconhecesse o esforço que fizemos por algo ou alguém? A canção é mais que suficiente para garantir o lugar de Adele no pedestal das grandes divas do mundo da música.



Adele encerra estrategicamente o álbum com “Love Is A Game”, uma canção que reflete o quão complicadas as relações amorosas podem ser, mas que no fundo procura dar esperança aos corações despedaçados. Apesar do amor ser um jogo para os tolos jogarem, tal como canta Adele, o ser humano, naturalmente, acaba sempre por querer voltar a esse estado: “I love me now like I loved him / I'm a fool for that / You know I, you know I'm gonna do it”.


É um dos melhores trabalhos musicais do ano e o melhor da carreira da artista. O LP elevou Adele a um novo nível de qualidade artística. Não é mais um álbum sobre desgostos amorosos, mas sim uma obra-prima resultante de um longo processo de luto e superação pessoal. Nem todos conseguem verdadeiramente identificar-se com um divórcio, mas ao ouvir o álbum ficam com uma ideia geral dos diferentes sentimentos que nos engolem durante o processo.


É uma reflexão interior transformada em arte que nos inspira e permite que ultrapassemos os momentos mais negativos do nosso percurso pessoal, mesmo quando temos a sensação de que é o fim do mundo. “30” trespassa as linhas regidas da perfeição.




Artigo escrito por: João Múrias


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