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  • Foto do escritorSara Arnaud

O Futebol é a Igreja Católica do Desporto

Atualizado: 19 de jan. de 2022

São primos de 2º grau e confundidos por muitos. A Igreja e o Futebol representam aqueles parentes que chegam forçosamente atrasados aos jantares de Natal. Traços semelhantes? Conservadorismo e preconceito, não fossem eles da família d’Os Três F – Futebol, Fátima e Ferrugento. Ao longo da sua existência, foram utilizados como instrumentos de opressão e manipulação por ditaduras desumanas.

Foto: Twitter Premier League

Caminhamos para o centenário do campeonato nacional de futebol e, até hoje, nunca houve um jogador profissional a assumir a homossexualidade. Nem mesmo depois de abandonar o campo. Na ótica mundial, o cenário é bastante similar, mas já se despontam algumas saídas do armário.


“Sou futebolista e sou gay”. Foi assim que o jogador do Adelaide United, Josh Cavallo, marcou aquele que foi (talvez) um dos golos mais importantes da história do futebol ao tornar-se no primeiro profissional ativo a assumir-se homossexual.

No testemunho histórico, que emocionou o mundo, o futebolista australiano vincou as dificuldades em manter escondida a orientação sexual para se inserir no estereótipo do futebol, temendo um impacto negativo na carreira. Apenas este ano, foi dado o pontapé de saída para a normalização da homossexualidade. Serão raros os casos ou uma questão de medo de não serem aceites na modalidade?


A resposta encontra-se facilmente nos comentários das publicações feitas pelos media relativas ao jogador australiano. A um “enter” de distância, multiplicaram-se intervenções pejorativas, injúrias e depreciações. “Isso é nojento e não tem respeito pela natureza humana”, “Deus criou Adão e Eva e não Adão e Steve” foram alguns dos exemplos.


Contudo, a discriminação trespassa as barreiras do online e contamina o estádio. Os fãs, infetados com doses colossais de ódio, repudiam qualquer iniciativa pró-LGBT+, como é o caso da campanha “Rainbow Laces”. Promovida pela Premier League, trata-se de, durante alguns jogos, os atletas utilizarem braçadeiras de capitão com as cores LGBT+. Também em junho deste ano, mês em que se celebra o “pride month”, a UEFA proibiu a arena de Munique de prestar uma homenagem e iluminar o estádio com as cores da bandeira LGBT+.

O desporto-rei carrega nas costas os preceitos tribais e rígidos de uma sociedade “masculinizada”. Aos olhos dos adeptos, a modalidade é sinónimo de virilidade. Com isto, a imagem de um jogador homossexual é incongruente num campo de futebol, como se existisse uma relação entre orientação sexual e ter ou não força física.

É um jogo de nobres, assistido por feras. As bancadas tornam-se palco de discursos insultuosos e ambientes parcamente inclusivos. É habitual más jogadas e más ações de determinado jogador espoletarem um grito ensurdecedor e unânime de ataques homofóbicos. Esta atitude estabelece um casamento forçado com a “masculinidade tóxica” dominante na generalidade dos balneários das equipas.

São várias as razões que influenciam a decisão de um futebolista em não se assumir ao público. Por trás de um denso manto de silêncio, refugiam-se inquietudes e medos, vidas duplas e tormentos múltiplos. É urgente reforçar as medidas de prevenção e proteção de futebolistas homossexuais. Cabe às grandes entidades do futebol jogar a favor dos direitos humanos, apostar em ações de sensibilização e tornar o desporto um meio inclusivo.

Para os homossexuais, o jogo começa muito antes do apito inicial, porque viver de forma clandestina é uma missão ingrata, penosa e sufocante. Josh Cavallo abraçou a igualdade num desporto que se mostra desigual, de diversas formas. Apesar do seu ato resiliente e corajoso, a homossexualidade e comportamentos discriminatórios continuam lado a lado no futebol. Desde os balneários às bancadas, ínfimos passos e ritmo lento caracterizam o longo caminho a percorrer.

A linha tênue entre Igreja Católica e Futebol perpassa as linhas do campo e fundamenta-se em discursos de ódio e preconceituosos. É hora de, no desporto-rei, assumir-se os pecados, “chutar para canto” a homofobia e reinar a integração, pois quando um jovem pousa as chuteiras por insegurança é uma derrota para o mundo do futebol. E eu pergunto: quantos futuros astros da bola já deixamos escapar?



Artigo escrito por: Sara Arnaud



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