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Foto do escritorJornal Invicto

Cassete Pirata lança novo álbum: “Não é um disco de acusação, é um disco de esperança”

Atualizado: 18 de jan. de 2022

A 21 de outubro, os Cassete Pirata plantaram no Maus Hábitos, o segundo disco "A Semente". A sonhar com um novo mundo, João Firmino contou, em conversa com o Invicto, todo o processo criativo que levou ao lançamento do novo disco conceptual. Unidos pelo jazz, a banda apresenta, na cidade do Porto, um álbum com "mais portugalidade".

Da esq. para a dir.: António Quintino (baixo), João Firmino (voz e guitarra), Margarida Campelo e Joana Espadinha (vozes e teclas) e João Pinheiro (bateria). Foto: Martim Torres

É ao fim da tarde, na sala de espetáculos dos Maus Hábitos, que se faz ouvir o soundcheck dos Cassete Pirata. João Firmino, vocalista da banda de indie rock, fez uma pausa para falar com o Invicto sobre o novo disco, lançado em outubro pela Rastilho Records.


A apresentação d’A Semente decorre ao vivo numa tour que marca o regresso aos palcos. Regendo-se pela visão das três gerações – crianças, adultos e idosos – e pelas suas diferentes perspetivas sobre mundo, os Cassete Pirata optaram por dar, neste álbum, “um passo em frente na exploração das vozes” e apostar num disco conceptual.


Formada em 2016 pela paixão de cinco amigos, a banda é constituída pelo vocalista e guitarrista João Firmino, pelo baixista António Quintino, pelo baterista João Pinheiro e pelas cantoras e teclistas Margarida Campelo e Joana Espadinha.


Desde a escolha das suas canções para a série "Até que a vida nos separe", a banda de indie rock tem vindo a somar cada vez mais fãs. Para o futuro próximo, fica enunciado um desejo: “Entrar mais no circuito das festas académicas.”


“A Semente” cruza 3 gerações e o olhar delas sobre o mundo atual. Que mundo é esse?

João Firmino (JF): Neste disco, não tentamos fazer um retrato do mundo atual. É algo mais humilde: dar uma visão daquilo que poderia ser uma criança que de repente não pode estar a viver os dramas da adolescência normal; uma geração de meia-idade que se pergunta que semente é que vai plantar para, no futuro, os filhos poderem sonhar com outro mundo. E uma geração mais velha que vê o mundo como está, mas não se sente necessariamente culpada com isso. Não se foca nos culpados, mas no que é que a nossa geração pode e vai conseguir fazer para podermos sonhar com um mundo diferente, sem problemas.


"Não é um disco de acusação, é um disco de esperança."

Qual a importância de colocar esses problemas no disco?

JF: Foi um processo natural que tem a ver com as bandas e os artistas que gosto. Todas as minhas influências sempre quiseram falar sobre o caminho que o mundo está a tomar. Há muito tempo que já tinha vontade de experimentar fazer um álbum conceptual, que tivesse uma história que unisse todas as canções de uma forma coerente e não forçada. Fazer mais um exercício artístico do que um exercício comercial de conseguir provar-me na indústria. Foi mais eu a ser chamado para falar sobre isto do que propriamente estar a forçar.


Cassete Pirata durante o "sound check" no Maus Hábitos. Foto: Inês Cristina Silva
Se tivesses de distribuir as canções por gerações, qual é que era qual?


JF: Isso é estar a abrir o livro. O que posso dizer é que não é taxativo, a piada é quem ouvir tentar descobrir. Se calhar há umas canções mais óbvias, mas há outras que podem ser até interpretadas pelas três gerações de uma maneira diferente. Um artista que eu gosto muito, o Rodrigo Amarante, diz sempre que para nós, que escrevemos a música, no dia em que ela é feita, ela deixa de ser nossa e passa a ser de quem a ouve. Na minha curta carreira como autor de canções, é muito fixe quando alguém tem uma interpretação completamente diferente da canção que tu fizeste e que é igualmente válida e rica.


O que distingue “A semente” do vosso primeiro disco “A montra”?


JF: É um disco que tem mais portugalidade. Tem um tom mais de observador, de pôr o dedo na ferida. Isto obrigou-me a abordar a língua de maneira diferente. Neste disco, há um discurso mais direto nas letras. Também na questão das melodias, talvez por necessidade desse discurso mais direto, a maneira como a minha voz aparece está quase como aquela voz ancestral, a solo, como os cantares populares. É um disco mais pesado do que o outro e em que demos um passo em frente na exploração das vozes, principalmente das meninas.


O processo de criação e produção do disco foi fácil?

JF: Para mim não foi nada fácil, porque de repente ficamos todos confinados. De todos os trabalhos que já fiz, foi o mais desafiante. A pré-produção foi feita à distância, cada um em sua casa ia gravando a bateria, o baixo …. Estivemos todos a patinar na saúde mental e, honestamente, compor um disco não era algo que me apetecia estar a fazer naquele momento. Por outro lado, sinto que ele ganhou por estar nessas circunstâncias.



Capa do novo álbum. Foto: Martim Torres
Como está a ser dar vida ao álbum nos palcos?


JF- Está a ser uma maravilha. Estivemos durante algum tempo com concertos em que as circunstâncias não eram muito naturais para uma banda de rock, ou seja, as pessoas estarem sentadas, de máscara, toda a gente com um ar aflito de incumprir alguma regra. Portanto, agora poder voltar é maravilhoso, as pessoas estão com uma fome brutal de concertos e isso sente-se no olhar da malta.




Atualmente, há alguma dificuldade em formar uma banda, principalmente de jazz e indie rock, em Portugal?

JF: Portugal é um país muito pequenino que não exporta muita música, sem ser o fado. Num mundo em que, cada vez mais, se começa a viver de redes sociais e plataformas de streaming e já não se vendem CDs, acho que a dificuldade é essa. Mas também sinto que neste meio quem faz as coisas, faz porque ama muito e não se vê a fazer outra coisa. Quanto ao jazz, nunca entendo como está em termos de pulso, se está mais vivo ou mais morto. Portugal é um país onde ainda há muito por fazer pela cultura. Claro que precisamos de investimento, mas também precisamos de educar as pessoas para consumirem a cultura portuguesa. De facto, é preciso muito amor e resiliência.


Têm projetos separados, qual foi a motivação para se juntarem?

JF: A motivação foi um ato egocêntrico de querer fazer as minhas canções. Já os conhecia a todos de diferentes projetos e foi esse o mote para sentir que gostava de ter as minhas canções e fazer a minha banda. Nunca quis estar naquele lado isolado de ser um autor em nome próprio. Chamei-os, porque são excelentes músicos, mas principalmente porque são ótimas pessoas. A cumplicidade é difícil de se explicar e, nesse sentido, somos uma banda muito cúmplice, funcionamos como uma família que gosta muito de estar na estrada.



A série “Até que a vida nos separe” recorreu a várias músicas do vosso primeiro álbum “A montra”. Sentem que ganharam mais reconhecimento do público após a estreia da série?

JF: Sim, sem dúvida. Estamos a voltar aos concertos e isso sente-se. Agora começa a aparecer malta que nunca tínhamos visto antes nos concertos e que vieram através da série.


"A televisão continua a ser muito decisiva para as bandas. Ainda por cima a série estava com muita qualidade, então ainda mais orgulhosos ficamos de unir as nossas canções àquele trabalho."

A escolha das músicas para a série balançou com a pandemia e o facto de não puderem dar concertos?


JF: Completamente. Eu lembro-me perfeitamente de estar de férias e ser muito deprimente olhar para a agenda e ver as datas que estaríamos a ter. Trouxe um equilíbrio na parte emocional. Tivemos uma oportunidade altamente. Ainda por cima as músicas já estavam gravadas, ou seja, não houve aquela pressão e necessidade de ir para o estúdio gravar à pressa. É uma felicidade brutal as músicas parecerem que tinham sido feitas para a série.


Têm algum palco específico que ambicionam pisar?


JF: Gostava de poder entrar mais no circuito das festas académicas, pelo tipo de banda que somos e pelo tipo de som que fazemos. Acho que ia casar bem. O natural é quereres fazer o que ainda não fizeste e quanto maior, melhor.


Qual é o futuro próximo para os Cassete Pirata?


JF: É desafiante este início em que continuo a ser músico como sempre fui, mas agora sou músico e sou pai. Honestamente, eu quero descansar da pressão de ter de escrever um disco novo. Por outro lado, estou cheio de vontade de o fazer. No próximo ano, vou começar a pensar, com calma, o que é que vou fazer para o terceiro disco. A ideia com que esta banda começou mantém-se: é ir resistindo e continuar a fazer discos bons.



Artigo escrito por: Inês Cristina Silva e Sara Arnaud

Fotos: Inês Cristina Silva


Artigo publicado originalmente no jornal online JPN

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